domingo, 27 de janeiro de 2008

Marionetes up e bonecas down

Eu ainda não sei o porquê de um assunto me levar ao outro, e nem sei se parecerá claro, mas escrevi mesmo assim.

__Se vem um de-muletas, cedo meu lugar. O mesmo com velhos, grávidas etc., com ou sem local demarcado. Mas nem todos são assim. Fingem que dormem enquanto o idoso trinca seus joelhos quebradiços no balanço rebolante da ginástica onibulatorial. Dar a cadeira marcada é lei; a não marcada é lucro.

__Se não fossem as leis e o punho cerrado da multa aos folgadões, diversas pessoas, dessas portadoras de deficiências, teriam muito mais dificuldade de acesso do que um cidadão comum em seu estado de "normalidade física".

__Uma vez fiz um vídeo institucional sobre o deficiente visual no mercado de trabalho e me surpreendi com a capacidade que eles, julgados frágeis, têm pra se virar no trabalho ou na cidade voraz. Mas se não fossem as leis, as cotas empresariais e as obrigações sociais, coitados.

__Por que nós temos essa necessidade de sermos obrigados a respeitar? Por que a gentileza, para ser legitimada, precisa tomar forma de artigo constitucional? O trânsito canibal das ruas, as filas, o empurra-empurra está aí para provar.

__Numas de minhas leituras me deparei com uma agradável novidade: uma empresa espanhola fabricou bonecas com traços de Síndrome de Down. O sucesso foi estrondoso e novos lotes, de importação, foram solicitados Europa afora.

__O argumento da empresa, justificando a iniciativa, me agrada: “O objetivo é promover a integração. Que as crianças aprendam a conviver, aceitar e compreender as diferenças. Os brinquedos são uma grande ferramenta para ajudar na integração social. Se há anos surgiram as bonecas de raças diferentes, porque não uma com outras características especiais?”

__Quem sabe se não é da infância o caminho para eliminar as degentilezas que acometem adolescentes, jovens e adultos? Bonecas com Síndrome de Down são interessantes para que os pequenos saibam que existem pessoas assim, e que devemos brincar/tratar com elas como se fossem normais.

__(Eu ainda não sei o porquê de um assunto me levar ao outro, porque ainda tenho o (talvez) defeito de sentir que todo altruísmo cheira defensiva moralista.)

__Pena que as bonecas se restringem ao universo feminino. Os meninos continuarão pedindo seus carros possantes, seus falos coisificados.

__Também se limita à classe social mais alta, em cujos pais possuem R$ 65 para presentear como boneca (que, provavelmente, não será a única no pacote de presente). A criançada do Brasil com ésse e ú continuará com bonecas de pano, pipas, rolemã (que na minha opinião são bem mais legais que os Hot Wheels), e, quiçá não, armas. Porque ainda não inventaram bonecas que educam a criança a olhar o pobre com olhar mais humano e menos estatal.
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