Mascarada dos camaradas
"— Camaradas! — gritou uma voz juvenil. — Temos gloriosas notícias! Ganhamos a batalha da produção! Os totais completos da produção de todos os artigos de consumo demonstram que o padrão de vida aumentou nada menos que vinte por cento sobre o ano passado. Em toda a Oceania houve esta manhã incontroláveis demonstrações espontâneas, com os trabalhadores marchando das fábricas e escritórios, e desfilando pelas ruas, com estandartes exprimindo sua gratidão ao Grande Irmão, pela nova vida feliz que a sua sábia liderança nos deu. Eis alguns dos totais finais. Gêneros alimentícios...
A expressão "nova vida feliz" correu várias vezes. Ultimamente, tinha caído no gosto do Ministério da Fartura. Parsons, a atenção presa pelo toque marcial, escutava com ar solene e boca aberta, mistura de aborrecimento e enlevo. Não podia acompanhar as cifras, mas tinha certeza de que deviam causar satisfação. Tirara do bolso um cachimbão imundo, já meio cheio de fumo chamuscado. Com cem gramas de tabaco por semana, raramente era posível encher o cachimbo até em cima. Winston fumava um cigarro Vitória, que mantinha cuidadosamente na horizontal. A nova ração só começava no dia seguinte e lhe restavam apenas quatro cigarros. Conseguia fechar os ouvidos aos barulhos mais distantes e estava escutando a parlapatice da teletela. Aparentemente, houvera até demonstração de agradecimento ao Grande Irmão por aumentar para vinte gramas a ração semanal de chocolate. No entanto, apenas na véspera, fora anunciada a redução para vinte gramas. Seria possível que engolissem aquilo, vinte e quatro horas depois? Pois engoliam. Parsons engoliu facilmente, com estupidez de animal. A criatura sem olhos, da outra mesa, engoliu fanaticamente, apaixonadamente, com um desejo furioso de descobrir, denunciar e vaporizar quem quer que ousasse sugerir que na semana passada anterior foram trinta gramas."¹
"Desde o início da operação militar no Iraque, o governo dos Estados Unidos calcula ter gasto mais de US$ 290 bilhões. Para algumas organizações independentes, este custo pode ser ainda maior: a ONG National Priorities Project, um grupo independente que visa medir os gastos governamentais em diversas áreas, diz que a Guerra do Iraque já consumiu mais de US$ 409 bilhões ao cofres públicos americanos."²
¹ 1984, de George Orwell.
² Folha Online, 20 de março de 2007.
A expressão "nova vida feliz" correu várias vezes. Ultimamente, tinha caído no gosto do Ministério da Fartura. Parsons, a atenção presa pelo toque marcial, escutava com ar solene e boca aberta, mistura de aborrecimento e enlevo. Não podia acompanhar as cifras, mas tinha certeza de que deviam causar satisfação. Tirara do bolso um cachimbão imundo, já meio cheio de fumo chamuscado. Com cem gramas de tabaco por semana, raramente era posível encher o cachimbo até em cima. Winston fumava um cigarro Vitória, que mantinha cuidadosamente na horizontal. A nova ração só começava no dia seguinte e lhe restavam apenas quatro cigarros. Conseguia fechar os ouvidos aos barulhos mais distantes e estava escutando a parlapatice da teletela. Aparentemente, houvera até demonstração de agradecimento ao Grande Irmão por aumentar para vinte gramas a ração semanal de chocolate. No entanto, apenas na véspera, fora anunciada a redução para vinte gramas. Seria possível que engolissem aquilo, vinte e quatro horas depois? Pois engoliam. Parsons engoliu facilmente, com estupidez de animal. A criatura sem olhos, da outra mesa, engoliu fanaticamente, apaixonadamente, com um desejo furioso de descobrir, denunciar e vaporizar quem quer que ousasse sugerir que na semana passada anterior foram trinta gramas."¹
"Desde o início da operação militar no Iraque, o governo dos Estados Unidos calcula ter gasto mais de US$ 290 bilhões. Para algumas organizações independentes, este custo pode ser ainda maior: a ONG National Priorities Project, um grupo independente que visa medir os gastos governamentais em diversas áreas, diz que a Guerra do Iraque já consumiu mais de US$ 409 bilhões ao cofres públicos americanos."²
Matá de fome, té que mofe. Eu que tome, enche o cofre.
Tira aqui, sobe lá, as anias tomam chá. Paz é gué, guerra é pá.
Os camarada Dão o cú, cobram nada. Óia a cifra. Ói África. Os camarada dão? O cú! Cobram, dana...
— Barriga saco sem fundo. Pu falá em saco, neguim torto, Papá Noé é mericano...
Tira aqui, sobe lá, as anias tomam chá. Paz é gué, guerra é pá.
Os camarada Dão o cú, cobram nada. Óia a cifra. Ói África. Os camarada dão? O cú! Cobram, dana...
— Barriga saco sem fundo. Pu falá em saco, neguim torto, Papá Noé é mericano...
¹ 1984, de George Orwell.
² Folha Online, 20 de março de 2007.
Um comentário:
Nossa, que 'paulada'! Texto ácido e fantástico. Você cada dia melhor e admirável... Adorei!
Super beijo pra ti.
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